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Conheça os roteiros do turismo místico no Peru

Acompanhe a equipe de reportagem do Maryjuana desbravando os principais roteiros do turismo místico no Peru.

A uma quadra da praça central de Cusco, no Peru, logo atrás da Catedral, o anúncio na lousa de acrílico chama a atenção entre quadros, peças de artesanato e roupas expostos quase na calçada da Calle Triunfo: “Today Ayahuasca Ceremony 6pm. Shaman Shop”.

Dentro da tal loja, depois de perguntada sobre algumas informações a respeito da cerimônia, a funcionária responde que “o tour custa 100 dólares” e já abre uma pasta para mostrar fotos do local e explicar o que está incluído ou não no preço. Como se estivesse vendendo um pacote turístico para Machu Picchu ou um passeio ao Vale Sagrado dos Incas.

A poucos metros dali, em outra agência de viagens misturada com loja de artesanato, o banner na entrada lista os produtos oferecidos. Entre visitas a ruínas, passeios a cavalo ou de bicicleta e tickets de avião, estão também cerimônias de Ayahuasca e San Pedro. Serviços parecidos, preços similares: 100 dólares para o primeiro ritual, 80 para o outro.

Cerimônias xamânicas são oferecidas em meio a passagens de ônibus e avião

Na praça de San Blas, um dos bairros históricos mais visitados por turistas em Cusco, um jovem com poncho e gorro andinos cumprimenta a todos que passam em frente à sua loja/agência com um “Hola amiga! Ayahuasca? San Pedro?”. O papacho é Joel Tello Vilchez, 33 anos, um dos donos da agência Portal of Light, especializada em um mercado que vem crescendo no Peru: o chamado “turismo místico”. Além de rituais e tratamentos com plantas “sagradas” (para alguns, “alucinógenas” para outros), em Cusco este ramo do turismo envolve visitas a templos, oferendas à Pachamama (Mãe Terra) e leituras de folhas de coca feitas por xamans para visitantes interessados – e dispostos a pagar.

Mas o uso de substâncias psicotrópicas – ou enteógenas, para usar o termo popularizado pelo inventor do LSD, Albert Hofmann, que designa os preparados vegetais utilizados em contextos ritualísticos ou xamânicos – não é novidade nos Andes. A presença do cactus San Pedro ou wachuma (que contém mescalina, assim como o peyote) na iconografia da civilização Chavin, que ocupou a parte norte da sierra peruana entre 1400 a.C. e 400 a.C., é um dos exemplos mais famosos da utilização de enteógenos por culturas pré-colombianas.

O San Pedro - ou Wachuma - é usado nos Andes há mais de 3 mil anos

Talvez tão antigo quanto o consumo de San Pedro nos Andes é o uso da ayahuasca na Amazônia. Conhecida no Brasil também como Santo Daime ou Vegetal, a bebida é uma mistura de duas plantas: o cipó mariri (Banisteriopsis caapi) e a folha chacrona (Psychotria viridis). A combinação dos dois libera a substância DMT no cérebro, causando, entre outras sensações, visões tão vívidas quanto a realidade. Segundo pesquisadores do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, isso acontece porque o DMT atua em neurotransmissores que também participam de experiências visuais de verdade.

Turismo místico: tours vegetais

Seja através de livros como Food of the Gods, de Terence McKenna, dos quadros de Pablo Amaringo (artista plástico peruano conhecido por suas obras inspiradas em visões de ayahuasca) ou mesmo por documentários à la Discovery Channel, estas plantas têm despertado a curiosidade do Ocidente há algumas décadas.

Não é à toa que na antiga capital do Império Inca – e hoje um dos principais destinos turísticos da América do Sul – nem é preciso falar espanhol para encontrar uma maneira de experimentar el pedrito ou la hoasca. A agência do papacho Joel Vilchez, que, apesar da vestimenta andina, é natural de Trujillo, na costa norte peruana, é só mais uma entre tantas outras que oferecem rituais-tours em Cusco.

Cerimônias da Portal of Light são conduzidas por um xamã que deve ter a habilidade de fechar o ritual segundo o cronograma

Fundada em 2009, a Portal of Light recebe clientes através de outras operadoras de turismo e também por recomendação. Na sua é possível acessar vídeos e também o catálogo bilíngue da companhia, com uma breve explicação sobre o uso de cada uma das plantas, os itinerários dos tours de 1 dia ou 1 dia e uma noite e o que está incluído ou não nos preços, que variam de US$ 90 a US$ 400 .

As “experiências místicas” estão separadas em três categorias: VIP, médio e backpacker. A diferença entre elas é somente o tipo de transporte (público ou privado) e o tamanho do grupo (de no máximo 10 pessoas, sendo que quanto mais gente, menos se paga). Todas têm horários de início e término determinados, que são assegurados, segundo Vilchez, pela habilidade do xaman de “fechar” um ritual.

Fundada em 2009, a Portal of Light recebe clientes através de outras operadoras de turismo e também por recomendação. Na sua página de Facebook é possível acessar vídeos e também o catálogo bilíngue da companhia, com uma breve explicação sobre o uso de cada uma das plantas, os itinerários dos tours de 1 dia ou 1 dia e uma noite e o que está incluído ou não nos preços, que variam de US$ 90 a US$ 400 .

As “experiências místicas” estão separadas em três categorias: VIP, médio e backpacker. A diferença entre elas é somente o tipo de transporte (público ou privado) e o tamanho do grupo (de no máximo 10 pessoas, sendo que quanto mais gente, menos se paga). Todas têm horários de início e término determinados, que são assegurados, segundo Vilchez, pela habilidade do xaman de “fechar” um ritual.

Quem preferir uma cerimônia "self-service" pode encontrar plantas in natura ou as bebidas prontas à venda nos mercados de Cusco

Ele ressalta, entretanto, que o serviço não é para turistas que querem simplesmente provar uma droga nova. “O San Pedro e a Ayahuasca não são drogas, são medicinas ancestrais. Para participar das nossas cerimônias, a pessoa tem que ter uma intenção, buscar sanar algo através da medicina”, esclarece.

E o fato dos rituais serem ofertados como um pacote turístico não vai contra o caráter “sagrado” das plantas? “Nós não estamos simplesmente ‘vendendo’ a medicina em um tour. Usamos ferramentas de marketing para facilitar a reconexão das pessoas com o Universo e com seu próprio ser”, explica. E completa: “Se há mais pessoas e empresas com esta missão, ótimo. Desde que tenham a intenção de difundir o aspecto medicinal das plantas”.

Ayahuasca, Buda e Yemanjá

Assim como os rituais do Santo Daime no Brasil têm uma forte influência do cristianismo e das religiões afro-brasileiras, o uso cerimonial da ayahuasca no Peru também está marcado pelo sincretismo. No templo da comunidade espiritual Ayahuasca Wasi, por exemplo, imagens de Yemanjá, Budas, Dalai Lamas convivem em harmonia com outros elementos do misticismo andino, como o palo santo, a água florida e as plumas de condor.

Sediada em uma propriedade de 3000m² com 10 bangalôs em Pisac, a 40km de Cusco, Ayahuasca Wasi promove retiros espirituais em que as principais atividades são: yoga, meditação, visitas a ruínas incas e sessões para tomar ayahuasca.

A comunidade existe há mais de 10 anos e foi criada por Diego Palma, 48 anos, um engenheiro de sistemas que, cansado do stress cotidiano em Lima, encontrou no “cipó dos mortos” as respostas até para problemas de infância mal resolvidos. “Meu agradecimento à planta por estas curas abriu a oportunidade de trabalhar com isso”, conta Palma.

Entre budas, cristais e plumas de condor, Diego Palma conduz rituais com ayahuasca

A cabeça raspada, as roupas em tons alaranjados e a voz calma lhe dão um ar de monge budista. O ex-funcionário da Telefónica entrou em contato com o budismo há 15 anos, quando também conheceu a ayahuasca. “O xamanismo e as filosofias orientais têm similaridades por estarem baseados em experiências diretas, não te pedem que creias em algo só porque dizem que é certo”, explica.

Ele mantém a mesma tranquilidade para dizer os preços dos serviços oferecidos: as cerimônias abertas, que acontecem às segundas e sextas-feiras, são 170 soles (cerca de R$ 145) para estrangeiros e 60 soles (R$ 50) para peruanos; os retiros de 1 semana custam US$ 1100, incluindo alojamento, alimentação, passeios turísticos e 3 rituais para beber “a planta”.

Apesar dos descontos para peruanos, a maioria das pessoas que procuram a comunidade são, segundo Palma, de outros países. Para ele, a principal causa desta diferença é a falta de interesse dos seus conterrâneos, já que “não temos problema em abaixar o preço das cerimônias abertas”.

Mais da metade dos clientes vêm através de recomendações e o restante pelo site, pois ele não trabalha com agências de turismo em Cusco. “Quem chega até nós já tem que ter tomado uma decisão, já sabe a que vem”, diz.

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As cerimônias conduzidas por Diego envolvem até 32 pessoas. Atualmente está construindo um templo onde 120 ayahuasqueiros poderão alçar voo com a ajuda da “planta professora”. Ele conta que já fez trabalhos com 150 participantes e que foi até mais fácil do que em grupos de 3 ou 4.

E os efeitos da bebida continuam iguais, mesmo sendo tomada fora do seu “ambiente natural”, a Amazônia? Sim.

De acordo com Palma, a ayahuasca “pega” tanto na selva quanto na serra, a diferença é o tipo de experiência. Na altura ele caracteriza a viagem como sendo mais voltada ao silêncio e à meditação, enquanto na floresta há uma interação maior com a natureza e seus sons, cores e aromas. “Você pode tomar a planta onde você quiser. Sempre será um processo lindo e transformador”, afirma.

Plantas, yoga e escalada

Quase todos os anos Diego vai a outros países para realizar cerimônias com ayahuasca. Quando foi à Tailândia em 2010, conheceu a norte-americana Kristie Lonczak, de 29 anos. Na época ela ensinava yoga ali, depois de ter passado 3 anos como instrutora de escalada na China. O baque do chá foi tão forte que hoje ela também promove retiros espirituais no Peru, às vezes dentro de Ayahuasca Wasi. Isso durante uma parte do ano, nos outros meses ela continua trabalhando com yoga na Índia e na Tailândia e guiando grupos de escalada na China.

Desta fusão de plantas sagradas com yoga e meditação e esportes de aventura nasceu em março de 2012 a Flowing Spirit Journeys, a agência que ela mantém junto com seu companheiro, o músico venezuelano German Boscan. A companhia não tem um escritório, só opera através de um website, o principal canal de divulgação e contato para os interessados.

“Também divulgamos muita coisa no Facebook e pelo GoogleAds”, explica Kristie. Os programas que eles oferecem no Perú são de 9, 10 ou 12 dias, custando de US$ 1590 a US$ 1980, incluindo 2 ou 3 sessões de ayahuasca e 1 de San Pedro, práticas diárias de yoga e visitas a templos incas, além de musicoterapia, especialidade de German . “Minha ideia original era conectar as pessoas a locais sagrados por causa do yoga e da meditação. No Peru, percebi que poderíamos aprofundar esta experiência com a ayahuasca”, relata.

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O casal também é responsável pelas cerimônias abertas às segundas em Ayahuasca Wasi, mas o foco deles são os retiros. Sobre os participantes, Kristie tem uma infinidade de histórias de curas quase milagrosas, de um viciado em heroína que abandonou as seringas a uma mulher com o útero atrofiado que conseguiu engravidar.

Mas para atingir estes efeitos positivos, ela afirma que é necessário saber de onde vem a “medicina” e se a pessoa que a preparou tinha as “intenções certas e os componentes certos”. Isso porque é comum, segundo Kristie, falsos xamans usarem, no lugar da chacrona, uma planta chamada toe, que, misturada com o cipó mariri, pode ser fatal.

A bebida servida por German, Kristie e Diego vem do mesmo lugar, uma família de preparadores de ayahuasca de Pucallpa, na Amazônia peruana. E ela se vê como uma xaman? Negativo. E German? Tampouco, ele se diz “um músico que serve ayahuasca”. Kristie explica que “praticamos xamanismo, mas não somos xamans”.

Também porque, para ela, a planta é uma ferramenta para as pessoas entenderem o que precisam mudar em si mesmas, mas não uma solução mágica: “depois das visões é preciso aceitar o desafio de integrar à sua vida o que a ayahuasca lhe mostrou”, conta.

*Reportagem: Carú Dionísio

* Fotos: Carú Dionísio, Helard Aguilar e divulgação

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