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Maconha: um santo remédio para esclerose múltipla

Tudo ia muito bem na vida do designer gráfico Gilberto Castro até que, em 1999, uma estranha dormência surgiu na parte traseira da perna. Em questão de três dias, o paulistano – então com 26 anos – perdeu toda a sensibilidade do pescoço para baixo.

Foi o início duma odisseia entre médicos, exames e hospitais, que culminou com o diagnóstico de esclerose múltipla, uma doença crônica do sistema nervoso central que afeta o cérebro e a medula espinhal, interferindo na capacidade de controlar funções como caminhar, enxergar e falar.

Segundo dados da Associação Brasileira de Esclerose Múltipla (Abem), atualmente 35 mil brasileiros são portadores da doença, que até o momento não tem cura.

Se não pode reverter o quadro, a medicina concentra-se em atenuar os efeitos e desacelerar a progressão da doença. Para isso, são utilizados medicamentos potentes e com efeitos colaterais tão – ou mais – devastadores que os sintomas da própria doença.

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Hoje com 42 anos, Gilberto já enfrentou surtos graves da doença e padeceu um bocado com as reações adversas de drogas com nomes bizarros como Copaxone, Mantidan e Baclofeno. No entanto, é a maconha – e só ela – que garante o verdadeiro alívio e bem-estar. “Só depois de fumar um é que me sinto como gente novamente”, declara.

Na entrevista a seguir, o designer – que se transformou numa das principais vozes do ativismo canábico brasileiro – conta mais sobre como a maconha auxilia no tratamento da esclerose múltipla, além de descrever as strains e formas de administração mais eficientes.

Mary: Como tem sido a evolução do seu quadro de EM? 

Gilberto Castro: A EM é uma doença progressiva e sem cura. Cada caso é único, mas em media 60% dos pacientes estarão acamados em 10 anos. Quando descobri que tinha a doença, em 1999, o médico disse que eu viveria no máximo até os 40 anos e que muito antes já estaria acamado. Completei 42 anos e ainda trabalho.

M: Qual sua situação de saúde no momento?

G.C.: A EM estava sob controle, segundo os médicos, com média de um surto a cada 2 anos. Mas, no meio do ano passado, num momento em que fiquei sem maconha, tive uma recaída mais forte, sendo que a doença progrediu da escala 3 para 7! Ou seja: antes eu tinha a esclerose mais branda, chamada emissiva remissiva, e agora é a secundária progressiva. 

Este também foi um aviso de que eu estou criando resistência ao Copaxone, remédio de Israel feito para ser usado com cannabis.

No final de 2014 tive outro surto no crânio, que deixou sequelas difíceis de conviver. Mas a maconha está ajudando muito no momento! Aliás, devido a estes surtos eu fui na Marcha da Maconha em São Paulo em maio correndo risco de vida.

Atualmente estou fazendo uma série de exames para saber se meu organismo tolera o remédio de segunda linha para EM, chamado Natalizumab, e que pode ocasionar a LEMP (Leucoencefalopatia Multifocal Progressiva).

M: Quais remédios você toma? Quantas doses/vezes por dia?

G.C.: Copaxone, Natalizumabe, Mantidan (espécie de cocaína legalizada), Baclofeno (antiespasmódico que não funciona direito, mas tomo para ajudar a dormir), Gabapeinnta, Dicloridrato de Pramipexol (para ajudar nas dores quando não dá para fumar maconha).

M: Desde quando você faz uso de maconha para tratar a EM? 

G.C.: Eu já tinha fumado alguns, mas como acreditava que era droga e tinha dificuldade de conseguir, sempre utilizava o álcool para diversão. Logo que descobri a doença, um médico disse que a erva poderia me ajudar. A partir daí passei a me informar e buscar informações em locais como o Growroom e a revista SuperInteressante. Desde 2002 eu utilizo cannabis para tratar a EM.

M: Como exatamente a maconha te ajuda no tratamento da EM?

G.C.: A cannabis ajuda muito e de muitas formas. Eu costumo dizer que o CBD salva, enquanto o THC alivia.  Basicamente, com o THC eu melhoro e controlo os sintomas e sensações ruins da doença – que não são poucos – e o CBD ajuda no controle da evolução da doença.

Nem mesmo sofrendo com os sintomas da esclerose múltipla Gilberto Castro deixa de comparecer à Marcha da Maconha.

M: Quais sintomas a cannabis combate exatamente?

G.C.A EM é a degeneração dos nervos do cérebro e dentro da coluna, causando tudo de ruim que se pode sentir. Entre as sensações corporais estão calor, frio, aperto, ardor, coceira, formigamento constante e muito incômodo. Além disso, quando a lesão é grande tem ainda os espasmos e dores localizadas. Isso sem falar nos sintomas mentais, incluindo mal estar geral, tonturas, lapsos de memória e estafa mental. É uma crueldade desmedida negar qualquer remédio para alguém nestas condições.

M: Como você utiliza a maconha para fins medicinais?

G.C.: Fumada e ingerida. Como não tenho problema de pulmão, faço questão da fumaça. É a diversão.

M: Flor ou concentrado: o que te ajuda mais?

G.C.: Os dois são excelentes para uso medicinal. Fumo a flor, que para as dores é muito bom, suave e com gosto delicioso que só a flor tem. Mas quando as dores estão muito fortes e estou passando mal, prefiro consumir óleo ingerido e fumado, que daí não tem erro: tudo melhora!

M: Das strains que você já provou até hoje: qual foi a melhor para aplacar os sintomas da EM?

G.C.: Eu percebi que sou um termômetro pra CBD, pois sempre identifico algumas características do alívio são causadas por ele. No geral, gosto muito da Royal Medical, que é excelente, faz passar as dores e tem efeito duradouro.

M: O Sativex é um dos mais famosos produtos comercializados para EM. Você já testou? 

G.C: Nunca provei, apesar de ter receita médica, pois o preço é ridiculamente caro aqui no Brasil. Ainda mais quando sabemos que o produto provém de uma planta. Pelas minhas pesquisas, creio que funcione bem, mas parece que demora até duas horas para fazer efeito. Adoraria testar e saber como é – afinal, chapar de Sativex, que não quer? (risos).

M: Por fim, deixe uma mensagem aos muitos leitores que acessam o site em busca de informação e alívio para a EM. 

G.C.: Temos que sair às ruas, comparecer às marchas e manifestações a favor da maconha, pressionar políticos…enfim, temos que nos unir e esfregar na cara dos reacionários que eles são burros e continuam investindo numa grande furada chamada guerra às drogas. É preciso legalizar a planta, tanto para uso medicinal como recreativo. É um crime não deixar um doente se tratar da forma que deseja, principalmente quando diversos profissionais de saúde no mundo concordam com essa forma de tratamento.

*Fotos: Pedro Strelkow

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