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Para deputados brasileiros, segurança pública se faz com (mais) criminalização

Aumentar penas e criminalizar condutas. Estas são as soluções propostas pelo Congresso Nacional para uma área tão complexa e multifacetada quanto a segurança pública do país.

Pelo menos é o que sugere um levantamento inédito realizado pelo Instituto Sou da Paz. Intitulada O papel do Legislativo na Segurança Pública: uma análise da atuação do Congresso Nacional em 2015, a análise esmiúça a atuação da Câmara dos Deputados e do Senador Federal, durante o ano de 2015, quanto à produção legislativa na área de segurança pública e justiça criminal.

O estudo revela que  40% dos projetos de lei apresentados na Câmara sobre o tema, no ano passado, propõem um endurecimento penal ou a tipificação de novos crimes. O restante das propostas referem-se basicamente a “interesses corporativos” da polícia, incluindo mais benefícios e gratificações à categoria

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Ao todo, 134 projetos de lei visam aumentar a pena correspondente a um tipo penal já existente, enquanto outros 131 projetos se referem à criminalização de uma nova conduta, ou seja, à incorporação de um novo tipo penal ao ordenamento jurídico.

Em se tratando de política de drogas, cujos crimes relacionados estão por trás do encarceramento de 28% dos detentos do país, apenas 14 projetos de lei foram propostos em 2015, sendo que um deles simplifica a importação de medicamentos que tenham como ingrediente substâncias proibidas no país.

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Seis projetos propõem ações no campo da prevenção ao uso de drogas, “a maior parte deles utilizando-se abordagens ultrapassadas da “guerra às drogas” e campanhas que promovem o medo, que diversos estudos já apontaram a baixa efetividade”, aponta o levantamento.

Completam o cenário (trágico) outros cinco projetos propostos tornam a política ainda mais rígida, na contramão das tendências progressistas observadas em países como Uruguai, Chile, Portugal e diversos estados norte-americanos, e mais duas propostas tratam do processo penal associado a crimes de drogas, como a destinação de bens apreendidos do tráfico.

“A primeira coisa que chama a atenção é que, apesar de uma grande histeria em torno do tema, como se praticamente todo o crime e todo o mal do mundo derivassem das drogas ilegais, há relativamente poucos projetos de lei que são apresentados para tratar do assunto”, destaca Felippe Angeli, coordenador de advocacy do Instituto Sou da Paz.

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Ao analisar o perfil dos parlamentares mais ativos no tema da segurança pública fica mais fácil entender a razão de tanta repressão e retrocessos.

Entre os cinco deputados federais que mais propuseram projetos relacionados ao tema, há uma expressiva concentração de parlamentares oriundos de carreiras policiais.

Também chama a atenção que, exceto pelo deputado Marcelo Belinati, todos os outros, quando apresentaram projetos de lei sobre armas de fogo, sempre tem por objetivo a flexibilização da legislação atual.

“De fato, um dos achados da pesquisa é um crescimento acentuado no número de deputados federais eleitos cuja profissão de origem é associada às forças de segurança. Outro achado foi que estes parlamentares tiveram uma ótima performance nas eleições, em sua maioria”, afirma Angeli.

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Embora esse grupo represente apenas 19 deputados entre 513, há um evidente crescimento do número de parlamentares ex-policiais ou milicos, conforme comprova o quadro acima.

“O que preocupa um pouco é um ‘sequestro’ da pauta da segurança pública por estes parlamentares”, pondera Angeli. “Muitas vezes eleitos com um discurso linha dura, de lei e ordem, percebemos que eles estão envolvidos em parcela considerável do debate parlamentar no campo da segurança pública. Isto me parece um problema, pois a democracia pressupõe pluralidade, diversidade.”

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Dos 19 deputados federais com origem em carreiras policiais e militares, 9 estiveram entre os mais votados em seus estados

Ou seja, da mesma forma que não seria benéfico termos apenas médicos legislando sobre saúde e professores sobre educação, as decisões sobre segurança pública não podem ficar apenas nas mãos de ex-agentes policiais e militares. “Todos os brasileiros são detentores de direitos sociais, então eles devem ser pensados de forma a incorporar a diversidade da sociedade.”

Estratégias ineficazes

O aumento da criminalização e das penas como solução não só é ineficaz para resolver as demandas da segurança pública, como também agrava outros problemas sociais.

“Como temos observado, a eficácia desta abordagem é questionável, além de ter impactos profundos no sistema carcerário, justiça criminal e na sociedade em geral”, aponta o relatório do Sou da Paz.

De acordo com dados do INFOPEN, entre 1994 e 2014, a população carcerária brasileira cresceu mais de 370%, sem que este crescimento tenha sido acompanhado da melhoria da segurança pública no país, embora tenha gerado custos financeiros e humanos relevantes.

“Acredito estamos vivendo um momento de grande tensão sócio-politica e que muitos atores tem interesse em promover o medo e a ideia do confronto como estratégia política. Simplificar o país num conflito entre ‘cidadãos de bem’ e ‘marginais’, embora reducionista e falso, tem um apelo político considerável, especialmente em momentos de crise”, opina Angeli.

Clique aqui para acessar o estudo na íntegra.

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