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Usuários de substâncias psicoativas lançam manifesto exigindo respeito e participação política

Entre os dias 5 e 6 de outubro de 2016, a cidade de Santo Domingo, na República Dominicana, foi sede da VI Conferência Latinoamericana e I Conferência Caribenha sobre Política de Drogas.

Considerado um dos mais importantes do gênero, o evento reuniu mais de 700 pessoas, entre ativistas e representantes de entidades antiproibicionistas do mundo todo.

Temas como políticas de drogas, racismo, violação de direitos, preconceito e encarceramento em massa fizeram parte da pauta.

Atenção aos usuários

Um dos destaques do evento foi a reunião da Rede Latinoamericana e do Caribe de Pessoas Usuárias de Drogas (LANPUD), com participação dos brasileiros da É de Lei, organização não-governamental dedicada à redução de danos para usuários de drogas

No encerramento do evento, os integrantes da LANPUD lançaram uma declaração pedindo mais respeito aos usuários de substâncias psicoativas, incluindo 10 pontos que resumem as necessidades e reivindicações desta expressiva parcela da população.

Leia a seguir uma tradução livre do documento – feita pela equipe Maryjuana – e clique aqui para conferir o texto original (em espanhol):

“A declaração a seguir representa a posição pública compartilhada, defendida e promovida por todos os membros da Rede Latino-Americana e do Caribe de Pessoas Usuárias de Drogas (LANPUD) lançada durante a VI Conferência Latino-Americana e I Caribenha sobre Política de Drogas.
Em nome da LANPUD, nós sentimos a necessidade de destacar e denunciar este paradigma hegemônico da proibição, estigmatização, patologização, discriminação e criminalização dos usuários de substâncias psicoativas. Tal paradigma é baseado em mecanismos de controle social e geopolítico fundamentados no racismo, classicismo, perspectivas sexistas, heteronormativas adultocentradas e exclusivas.
Por esta razão, queremos enfatizar 10 pontos que representam o nosso ponto de vista como usuários de substâncias psicoativas:
1) O paradigma proibicionista e abstencionista está estruturado na premissa de que o uso de substâncias psicoativas é sempre problemático, baseando-se muito mais em preconceitos morais e sociais do que em evidências científicas.
2) A proibição tem justificado ações extremas, o que resulta nas violações mais terríveis aos direitos humanos, como desaparecimentos forçados, execuções extrajudiciais e tortura, além do desperdício de milhões de dólares em políticas fracassadas.
3) Na América Latina e no Caribe, este paradigma significou a continuação do processo histórico de colonização e desmembramento das tradições originais que, ao longo da história, têm feito uso de plantas e substâncias psicoativas como maconha, peyote, ayahuasca ou os cogumelos psilocybe em contextos rituais, medicinais e recreativos, sendo fundamentais para a construção de identidade destas regiões.
4) A guerra às drogas tem gerado enormes danos colaterais à sociedade, transformando milhares de famílias em situações de abandono e vulnerabilidade social, sem estratégias ou meios adequados de reparação.
5) Várias ferramentas para a redução de riscos e danos já se mostraram eficazes para diminuir os impactos negativos das drogas nos usuários e comunidades.
6) É cada vez mais evidente que os modelos de tratamento que não impõem a abstinência são capazes de abordar a questão da dependência com maior respeito aos direitos humanos e, além disso, são mais eficazes do que outros tratamentos disponíveis hoje.
7) Dentro das políticas para evitar danos, exigimos que as estratégias de pulverização aérea não sejam retomadas, devido às consequências desastrosas para a saúde e economia de centenas de milhares de agricultores e consumidores.
8) Nós reconhecemos a legitimidade sobre a legalidade ou ilegalidade do direito ao prazer e à inviolabilidade da autonomia do corpo como um aspecto inalienável do desenvolvimento integral dos indivíduos, grupos sociais e identidades culturais que surgem das diferentes práticas associadas às substâncias psicoativas.
9) A justiça criminal não deve ser usada como uma medida destinada às pessoas que usam substâncias psicoativas, enquanto não causem danos, pois se deve evitar a todo custo direcionar o usuário para o sistema judicial, o que resultou na superlotação de presídio e afeta desproporcionalmente setores e/ou populações marginalizados pela etnia, orientação sexual, classe e gênero.
10) Sob nenhuma circunstância deve-se considerar a pena de morte como uma resposta a delitos de drogas. O uso destas substâncias deve ser abordado a partir de um sistema de saúde pública – e não como um comportamento a ser erradicado.
Com base nisso, lançamos um convite a reconhecer com humildade e honestidade a importância das relações com plantas e substâncias psicoativas como práticas de vida que são e têm sido constitutivas de nossa identidade regional, sabedoria ancestral e experiências contemporâneas.
Consideramos urgente a busca de políticas alternativas à proibição, defendendo a regulamentação da produção, preparação, distribuição, venda e consumo de plantas e substâncias atualmente ilícitas, permitindo o desenvolvimento sustentável e a segurança social nas comunidades locais mais afetadas hoje. Tais alternativas devem ser acompanhadas da reconstrução do tecido social, através de processos de aceitação da verdade, acesso à justiça e à reparação de danos.
As políticas públicas sobre drogas devem dar continuidade ao conhecimento e práticas gerados junto à população de usuários – incluindo-nos como parte da solução.
Nada sobre nós, os usuários, sem nós.
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