Cannabis na cadeia? É isso mesmo que você leu: a nova decisão da Justiça alemã reconhece o direito de presidiários possuírem até 50g de maconha para uso pessoal. Entenda como a lei vê a cela como residência habitual – e o que isso muda no cenário da legalização
Uma decisão judicial inédita na Alemanha acaba de abrir espaço para que pessoas presas possam manter até 50 gramas de maconha em suas celas, desde que seja para uso pessoal. A sentença, que já está dando o que falar por lá (e por aqui), reconhece a cela como uma “residência habitual”, o que garante ao preso os mesmos direitos previstos pela nova lei alemã sobre o uso adulto de cannabis.
Cannabis na cela? Sim, se for pra uso próprio
O marco jurídico foi estabelecido pelo Tribunal de Apelações de Berlim (KG) no fim de maio de 2025. De acordo com a corte, qualquer pessoa cumprindo pena de no mínimo seis meses pode portar até 50g de maconha dentro da cela, considerando que ali é, na prática, sua moradia atual – mesmo que de forma involuntária.
A decisão se baseia na nova Lei do Uso Pessoal de Cannabis (KCanG), em vigor no país desde abril, que permite a adultos manter essa quantidade em casa. Como uma cela atende aos critérios legais de residência habitual (local de permanência por mais de seis meses), o tribunal entendeu que os direitos se estendem ao ambiente prisional.
O caso que mudou tudo
A jurisprudência surgiu a partir do caso de um homem preso desde setembro de 2023, flagrado com 45 gramas de haxixe na cela. O produto, com cerca de 13g de THC, era para consumo próprio. O Ministério Público abriu um processo contra ele, mas a corte de primeira instância em Berlim-Tiergarten rejeitou a denúncia, citando a KCanG. Agora, com a decisão da instância superior, a interpretação se consolida.
O tribunal ainda enfatizou que o encarceramento não descaracteriza o conceito de residência habitual, mesmo que a estadia seja involuntária. Ou seja: cadeia também é “lar”, segundo a lógica da nova legislação.
Ministério Público tentou barrar
Mas é óbvio que nem todo mundo gostou. O Ministério Público recorreu da decisão, argumentando que a lei canábica não deveria se aplicar a penitenciárias e que a posse de maconha nas celas poderia comprometer a segurança e a ordem do ambiente prisional. Também alegou que, legalmente, a cela não deveria ser considerada uma moradia privada.
Mas a 5ª Câmara Criminal do Tribunal Regional foi taxativa: a definição de residência se baseia nas condições reais de vida do indivíduo, não em interpretações jurídicas mais rígidas. A corte também citou os documentos legislativos da KCanG, que priorizam a moradia de fato, e não o modo como a pessoa chegou até ali.
Pode ter, mas não necessariamente pode fumar
Importante destacar que a permissão é para posse, não para consumo. A corte deixou claro que as autoridades prisionais continuam com autonomia para proibir o uso de cannabis dentro das instalações, se julgarem necessário para manter a segurança e a ordem do local.
A legislação penitenciária vigente ainda permite que as prisões adotem normas que restrinjam tanto a posse quanto o consumo, independentemente da nova lei canábica.
E o cultivo de maconha na cadeia, pode?
A decisão não se aprofundou sobre o cultivo de cannabis nas celas, mas a questão fica em aberto. A KCanG limita o cultivo doméstico a ambientes “residenciais privados”, definição que poderia ou não incluir celas. Esse é um daqueles pontos ainda nebulosos, que deve gerar novas batalhas judiciais no futuro.
Em resumo: a Alemanha deu um passo importante ao reconhecer que direitos relacionados à cannabis precisam valer até mesmo atrás das grades. E essa decisão, que pode parecer absurda para alguns, é mais uma prova de que a legalização é um caminho que exige coragem, coerência e… boas leis.
*Por: Redação Maryjuana